domingo, 5 de dezembro de 2010

Passos

Ar pesado, tipo estranho, muitos dizem assim ser. O aspecto daquele que é visto todos dias, da semana, a passar por ali, com uma certa pressa.
Muitos não sabem quem ele é, também não se interessam, por assim dizer, procurar informações a seu respeito.
Um vulgar comum a tantos outros, ainda que não passe despercebido para alguns.
Ele contêm algo, que nela desperta curiosidade, não sabe bem o que é, mas algo a intriga, talvez o ache atraente, talvez arrisque uma abordagem, quem sabe...

Naquele dia de sol, uma terça, naquele preciso momento , ele passou por ela, meramente ao acaso, mas desta vez acompanhado por uma moça, bem gira por sinal. Seu ar pesado, tinha desaparecido por completo, nem parecia o mesmo homem que ali passava todos dias, da semana.

Ela ficou de pé atrás, pois aguardava por uma oportunidade de o abordar, ainda que disparatada. Seus olhos transmitiram um cenário triste, como tal, deixou-se ir abaixo acabando por desistir.

Mais tarde veio a descobrir, que aquela moça, gira, seria irmã dele, segundo dizia a cusca da vizinha, ela iria casar-se em breve.

Esperançosa, foi a correr para casa toda contente, algo mexeu com ela, de novo, vestiu a melhor roupa que tinha, maquilhou-se toda cheia de intenções, ficou lindíssima, diria mesmo, um espanto, para alguém tão franzina como ela. Mas quem a conhece, sabe que é uma jóia de pessoa.

Espevitada, foi a correr para o café, onde ele costumava ir ao fim do dia, na esperança de o encontrar e tentar desta vez, meter conversa, quiçá, quiçá.

O tipo entra no café, 19h42, pede o que deseja e senta-se na mesa, abrindo uma revista que trazia consigo, algo sobre fotografia.

Ela assim que o vê, começa a tremer, suas mãos começam a ficar geladas, o receio de que a sua tentativa seja frustrada instala-se no seu cérebro, dominando-a por completo. Também não era por menos, sentou-se perto dela, pois não havia mais mesas disponíveis.

Desta vez, foi ela que lhe chamou a atenção, a mesa do lado dele não parava de fazer barulho, parou de ler e olhou para ela. Por momentos, ambos os olhares comunicaram entre si, algo de sereno e calmo se manteve por alguns segundos, até que ele se chegou à frente.

-Estás bem?
-Hum...ESTOU NERVOSA, QUERO TE CONHECER E NÃO AGUENTO MAIS...desculpa, saiu...

Estupefacto, sem aviso prévio, ficou a assimilar o que lhe acabara de entrar pelos orifícios da comunicação.

-Ok, ok, não precisas gritar. Como te chamas?
-Luísa. 
-Olá Luísa, eu sou o Vitor...hum, tens sangue na boca...
-Ups, deve ter sido da pressão que fiz nos dentes, estou um pouco nervosa, vou só ali ao WC, volto já.
-Ok.

Apesar do incómodo de Luísa, o diálogo continuou. Passaram a encontrar-se mais vezes, e conheceram-se melhor, Vitor era um entusiasta da fotografia, algo completamente diferente do seu trabalho, era um passatempo, e Luísa, também ela começou a mostrar interesse pelo hobby. 

-Escuta, não podemos fazer barulho senão assustas-o.
-Está bem, estou mesmo agarradinha à máquina e pronta a disparar...espera, algo cheira mal aqui, mas que...
-Merda, pisei caca...

Desataram-se a rir e acabaram por assustar o bode, este, agora corria em direcção a ambos, era o alvo da objectiva que Luísa fixara, em vão.

Muitas outras situações caricatas, surgiriam entre estes dois. Havia quem não lhes ligasse nenhuma, outros alguma coisinha, verdade seja dita, o tempo corre, as oportunidades surgem, nem que tenhamos de ser nós mesmos a criá-las, por mais disparatadas que sejam, na nossa cabeça, mas sempre inofensivas. 

Algo se pode construir, nem que seja uma pequena, grande amizade.

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